Corinto – Uma Igreja com
Problemas de Disciplina:
Uma Análise
de 1 Coríntios 5
Augustus Nicodemus Lopes
O Contexto de Corinto
A igreja de Corinto era uma igreja que havia sido muito abençoada
por Deus em diversos aspectos. Quando Paulo inicia esta carta ele reconhece, no
capítulo primeiro, que Deus havia abençoado a igreja com toda
sorte de bênçãos espirituais, de dons espirituais, ao ponto
de “não lhes faltar dom nenhum”. Corinto era uma igreja
carismática no sentido bíblico da palavra, ou seja, tinha os
“carismas” do Espírito de Deus, os dons, através dos
quais desenvolvia seu serviço prestando culto a Deus e cumprindo a sua
missão neste mundo. Infelizmente, por motivos que desconhecemos, esta
igreja de Corinto, que havia sido fundada pelo apóstolo Paulo, com menos
de três anos de fundada começou a desviar-se dos padrões de
conduta e de doutrina que o apóstolo havia estabelecido por
ocasião de sua fundação.
Os Problemas de Corinto
1) Divisões
Paulo estava no seu último ano de ministério na cidade de
Éfeso, quando recebe informações de que a igreja de Corinto
não estava indo muito bem. As informações eram muitas e
poucas delas eram boas. Paulo soube que havia divisões na igreja, que
estava dividida em 4 grupos. Grupos que se formaram em torno de personalidades,
de pessoas que tinham tido uma participação no passado recente da
igreja, com o próprio Paulo e Apolo (cap. 3:4). Havia até um grupo
que talvez fosse o mais perigoso deles que era o “grupo de Cristo”
(‘...e eu, de Cristo” Cap 1:12). Eles diziam que não
eram seguidores de homem algum e sim de Cristo. Era como se dissessem:
não queremos estar debaixo da orientação ou da
instrução e autoridade de qualquer homem porque recebemos tudo
diretamente de Cristo. Alguns estudiosos têm identificado este grupo como
o “grupinho dos espirituais” que falavam em línguas e se
gloriavam por terem experiências extraordinárias; que não
aceitavam a autoridade de Paulo na igreja e outras coisas mais.
2) Problemas doutrinários
A igreja tinha todas estas divisões e além disso tinha
problemas de ordem doutrinária. Um grupo não aceitava a
ressurreição dos mortos (cap. 15). Havia um espírito
faccioso naquela igreja; existiam problemas com respeito à doutrina da
liberdade cristã ( 10:28). “Será que posso comer carne
sacrificada aos ídolos”? Os “fortes” diziam que sim e
subestimavam os “fracos”. Havia problemas com respeito às
questões do casamento (cap. 7): O que é mais espiritual? Casar ou
ficar solteiro?
A igreja estava dividida por uma série de problemas que se refletiam
no culto. Os “espirituais” falavam línguas sem
interpretação para a igreja e desta forma não edificavam
(14:5); os profetas falavam, mas não havia ordem de quem deveria falar
primeiro (14:29, 32); as mulheres entusiasmadas estavam querendo tirar qualquer
sinal de que há uma diferença entre homem e mulher dentro da ordem
da criação de Deus (11:8-9); na hora da Santa Ceia havia pessoas
que até se embriagavam (11:21) e participavam do sacramento sem ter o
espírito apropriado. Corinto era uma igreja com graves
complicações. Mas, mesmo considerando isso, era uma igreja que se
gloriava de ser “espiritual”. Afinal, muitos, na
concepção deles, não tinham os dons que indicavam a
presença do Espírito Santo? Muitos não estavam falando em
línguas durante o culto (Cap. 14)? Outros não estavam profetizando
e trazendo palavra de revelação? A igreja pensava que era
espiritual e considerava-se assim apesar de estar toda minada de problemas.
3) Problemas Morais
Entre os problemas mencionados havia também problemas morais. Havia
um irmão que estava processando outro num tribunal secular (6.4). Talvez
a igreja não tenha se interessado o suficiente. A verdade é que
não chegaram a um acordo e talvez por questão de terra ou talvez
de dinheiro e negócios, este irmão estava em litígio com
outro. Por isso estava processando-o no tribunal da cidade. Com esta atitude
estava expondo o Evangelho à vergonha diante dos ímpios (v. 6).
Havia um grupo que estava voltando à prática da
prostituição religiosa (6:18-19), o que era comum na cidade de
Corinto. Isso era praticado nos templos onde se cultuava a deusa Afrodite.
Refletindo esta separação entre espiritualidade e a conduta
moral surge um problema relatado no capítulo 5 e que estava bem de acordo
com a natureza e espírito da igreja. Havia um homem, membro da igreja,
que estava vivendo com sua madrasta. Seu pai provavelmente ainda estava vivo,
mesmo assim estava tendo “um caso” a mulher de seu pai. O mais grave
é que isto era do conhecimento não só da igreja mas
também da própria sociedade de Corinto. Era algo notório e
se comentava; circulava rumores verdadeiros com respeito a este incidente. Nos
traz constrangimento o fato de que a igreja de Corinto, como um todo, parecia
não ver nada de grave nisso: “Afinal Deus não está em
nosso meio? Vejam o que acontece nos nossos cultos”! E este homem
continuava a viver com sua madrasta às vistas de toda a igreja! Mas o que
mais incomodava o apóstolo Paulo era a falta de uma atitude firme por
parte da igreja com relação àquela pessoa. Ou seja, a
igreja deveria constatar que conduta moral e espiritualidade são duas
coisas que andam juntas. Temos de ter as duas coisas; e quando temos uma e
não a outra, ou a espiritualidade é falsa ou a moralidade é
falsa. Mas a genuína espiritualidade exige uma conduta de acordo com as
verdades do evangelho.
O interessante é que Paulo não se dirige à
liderança da igreja. Paulo, ao escrever, não se refere aos
líderes mas fala à igreja como um todo. Porque, mesmo que no
sistema presbiteriano, estes casos tenham a ver inicialmente com o Conselho, o
fato é que na base do problema, além de um caso notório,
pecado é um problema de toda igreja. É uma questão que
afeta todos os membros e que não é somente responsabilidade do
Conselho olhar para a vida dos outros membros e tomar algum tipo de
decisão, mas que é responsabilidade de cada membro do corpo de
Cristo zelar para que haja pureza, santidade, que haja no convívio da
comunidade, verdadeira santidade ao Senhor. É uma responsabilidade de
nós todos e não somente do pastor e dos presbíteros.
É importante, portanto, que Paulo trata da questão dirigindo-se a
toda comunidade. Talvez alguns estranhem este fato. Nas
denominações batistas e congregacionais as questões
disciplinares são resolvidas pela assembléia. Apesar de acharmos
benefícios no sistema de governo representativo, através de
pastores e presbíteros, a interpretação desta passagem
só pode ser neste sentido: Paulo não está se referindo aos
pastores e presbíteros porque ele sabe que a responsabilidade de vivermos
uma vida santa na igreja, é de cada um dos seus membros. Devemos
não só zelar por nós mesmos mas também pelo nosso
irmão refletindo as palavras de Jesus: “Se o teu irmão
pecar, vai repreendê-lo entre ti e ele só, se ele não te
ouvir, leva mais alguém, se não te ouvir, comunica a
liderança da igreja para que tomem as providências”. Mas,
antes de chegar a este ponto existe todo um processo intra comunitário
desenvolvido pelos membros, cada um participando e sendo responsável para
que a vida da igreja ande corretamente. Se não for assim corremos o risco
de sermos participantes dos pecados alheios e incorrermos na culpa de
cumplicidade.
Assim, o apóstolo Paulo, no capítulo 5, chama a igreja
à ordem e nos fala de forma apaixonada, fala com amor pela igreja; nos
fala da responsabilidade que todos temos de cuidar de nós mesmos, de
vivermos vidas santas e, de como comunidade, zelarmos para que o nome de Cristo
seja honrado e glorificado através da vida santa da comunidade dos
santos. Infelizmente nem sempre atentamos para esta maneira de Paulo abordar o
problema em vista do nosso individualismo. Mais freqüentemente do que
desejaríamos ouvimos falar de piedade em termos individuais, ou seja,
piedosa é a pessoa que se fecha no seu quarto para ler e orar gastando
tempo a sós com Deus. E santidade seria algo que se desenvolveria
individualmente. Quando falamos em santificação geralmente temos a
figura de uma pessoa em mente e nos esquecemos que Novo Testamento geralmente
estas coisas são contempladas à luz da comunidade. Piedade
é algo que eu exerço junto com o povo de Deus; culto
não é algo que eu presto individualmente a Deus, somente, mas algo
que faço com meus irmãos. Santidade é algo
comunitário. Nós crentes caminhamos a vida de santidade juntos.
Perdemos de vista este aspecto corporativo da Igreja apresentado no NT. É
tão importante, salutar, equilibrado e abençoador para cada um de
nós a idéia de andarmos juntos, vivermos juntos e nos
santificarmos com a ajuda uns dos outros. É neste contexto que o
apóstolo trás estas palavras.
O Texto
No versículo 1 e 2 encontramos o apóstolo Paulo apresentando
o assunto que vai falar. Ele coloca o problema com palavra muito claras. O
problema é duplo:
O Primeiro Aspecto do Problema
Primeiro, Paulo inicia dizendo que “Geralmente se ouve que
há entre vós imoralidade...” (v. 1) e depois especifica
que imoralidade é esta. O pecado é de incesto que está
proibido pela Lei mosaica em Deuteronômio 2:30 e outras passagens do VT
onde Deus revela Sua repulsa ao adultério e muito menos que um homem
faça isso com a mulher do seu pai. Era um caso claro de
transgressão da Lei de Deus. É importante notarmos que para o
apóstolo Paulo, a Lei de Deus sempre estava em vigor para o
cristão. Paulo caracteriza bem esta imoralidade, e, muito embora
não faça uma referência clara ao Antigo Testamento,
há evidências na passagem, de toda legislação do VT
sobre a conduta moral e sexual do povo de Deus. É bom enfatizar isso numa
época em que as pessoas têm demonstrado descaso para com a Lei de
Deus e para com os padrões morais das Escrituras. O apóstolo
está muito à vontade expressando o ensino do VT para uma
comunidade de cristãos do NT e caracterizando a conduta daquele
indivíduo como sendo imoralidade à luz dos padrões Vetero
Testamentários. Isso nos trás a um ensino importante, o de ter em
alto apreço o Antigo Testamento que também é
revelação de Deus para nós cristãos, ainda hoje.
Tudo que foi escrito, para nosso ensino foi escrito, para que através das
Escrituras e da paciência tenhamos conforto e
esperança.
Esta era a primeira parte do problema: uma relação incestuosa
de um homem que vivia com sua madrasta e que era do conhecimento de todos, como
se vê nas palavras de Paulo: “Geralmente se ouve que há
entre vós imoralidade...” (v. 1).
O Segundo Aspecto do Problema
A segunda parte do problema está no v.2: “E, contudo,
andais vós ensoberbecidos, e não chegaste a lamentar, para que
fosse tirado do vosso meio quem tamanho ultraje praticou?”. O que
angustiava o apóstolo Paulo não era só o pecado em si, mas
que a igreja, ao invés de “lamentar” o fato de ter um de seus
membros vivendo uma relação pecaminosa e tomar a providência
correta, que na ocasião seria tirar do meio da comunidade aquele
indivíduo que não havia se arrependido (a julgar pelo que Paulo
diz), ou que não queria corrigir-se. A atitude da igreja deveria ser
excluir este membro contumaz. Paulo está angustiado pelo fato da igreja
não tomar esta atitude para zelar pela vida e pela pureza da igreja,
pelo nome de Cristo e pelo próprio pecador. Ao contrário, a
igreja estava ensoberbecida, envaidecida possivelmente por causa dos dons
espirituais. Os membros estavam orgulhosos de constituirem uma igreja
“carismática”, ou quem sabe, uma igreja que amava a todos do
modo que eram e de como agiam. Uma coisa é certa: Paulo entendia que a
atitude da igreja não estava correta. Ao invés de lamentar e
chorar pelo fato de um membro está sofrendo, e quando isso acontece,
todos sofrem com ele, Paulo pensa na igreja em termos corporativos e vê
uma comunidade negligente por não lamentar-se em vista do pecado que
estava no seu meio. Ela assume uma postura oposta “festiva”, com um
culto alegre, enquanto ninguém estava se preocupando com o problema.
Paulo estava angustiado por ver um membro vivendo em pecado e por constatar uma
igreja tolerante que convivia com o problema sem nenhuma dificuldade.
Antes mesmo de dizer os princípios pelos quais a igreja deveria
expulsar o malfeitor que “tamanho ultraje praticou”, Paulo já
vem com a solução para o problema, até contrariando seu
método habitual, usado na primeira carta aos Coríntios. Paulo
geralmente coloca o problema, introduz uma série de princípios
doutrinários e no final apresenta a conclusão. Mas Paulo parece
tão atribulado que apresenta o problema e logo dá a
solução; só posteriormente fala sobre as doutrinas que
estão por trás da questão. Isso, talvez pela
angústia que lhe passava na alma em vista do grande amor que tinha por
aquela igreja. Do versículo 3 até o 5 Paulo diz o que vai fazer.
Ele fala como apóstolo de Jesus: “...já
sentenciei...”. Ele usa das prerrogativas de apóstolo, a quem
foi dada autoridade para edificar a igreja, fazê-la andar e para trabalhar
no seu fundamento. Como tal, ele sentencia. Esta palavra
“sentenciar” vem da linguagem jurídica que
significa o pronunciamento final de um processo de julgamento. A igreja deveria
ter feito isso e por que não fez, Paulo toma para si as prerrogativas de
juiz. Ele mesmo faz o julgamento, sentencia o membro infrator dizendo:
“...que o autor de tal infâmia seja, em nome do Senhor Jesus,
reunidos vós e o meu espírito, com o poder de Jesus, nosso Senhor,
entregue a Satanás para a destruição da carne, a fim de que
o espírito seja salvo no dia do Senhor [Jesus]” (vs. 3-5).
Quando o apóstolo Paulo sentencia que aquele infrator seja entregue
a Satanás, ele o faz nos termos do ensino de Jesus. Paulo aqui
está ecoando o ensino de Cristo quando disse num contexto de disciplina:
“Porque onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali
estou no meio deles” (Mt 18:20). Jesus já havia dito dois
versículos atrás (v. 18) que: “...tudo o que ligardes na
terra, terá sido ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra,
terá sido desligado no céu”. Este é um contexto
de disciplina, quando Jesus estava respondendo a Pedro sobre o que deveria ser
feito se um irmão pecasse contra ele. Jesus diz que a igreja reunida em
espírito, com a presença do Senhor e em Seu nome deveria exercer o
“poder das chaves”; de admitir alguém no Reino de Deus ou
então excluir através da disciplina. Paulo está ecoando o
ensino de Jesus quando diz: [Eu, juntamente com vocês] “em nome
do Senhor Jesus, reunidos vós e o meu espírito, com o poder de
Jesus, nosso Senhor...” (v. 4). Dessa forma Paulo sentencia o membro
daquela igreja.
O que significa “entregar a Satanás”? Isto tem
sido bastante debatido e não vai fazer muita diferença na
interpretação geral da passagem. Em linhas gerais se acredita que
Paulo estava dizendo o seguinte: Uma vez que a pessoa não queira ouvir a
voz da igreja, não aceita a repreensão do Espírito Santo,
e, sendo excluído da comunidade, será como uma ovelha que
foi colocada para fora do aprisco. Lá fora estão os lobos à
espera. Satanás vai cirandar, vai colocar sua mão em cima. O
objetivo de Paulo com isso não é destruir a pessoa como muitos
pensam em relação ao ato disciplinar. Em termos
eclesiásticos alguns pensam de disciplina como algo que trás
simplesmente punição ou destruição do pecador. Mas
não é este o objetivo da disciplina. Apesar de todo rigor e
firmeza de Paulo em tratar o assunto, ele diz: “...a fim de que o
espírito seja salvo” (v. 5). Este é o objetivo que Paulo
revela na sua carta; o amor por aquele pecador e seu desejo de
recuperá-lo, mesmo que para isso medidas drásticas tenham de ser
tomadas. Paulo não fica vacilante. Se tem de ser entregue a
Satanás, que seja, para que o espírito seja salvo. Se for o
único meio, que assim seja excluído da igreja, ficando fora da
proteção do Senhor e ficando exposto aos ataques do diabo. Ataques
que são descritos no livro de Jó, quando este servo de Deus
experimentou na carne a atividade satânica como doenças,
aflições, perdas dos bens, etc. Em fim, toda sorte de
aflições que com o decreto de Deus Satanás às
vezes pode infligir às pessoas para que o propósito de Deus seja
feito. No caso, para este membro da igreja, o propósito era
trazê-lo de volta ao seio da igreja através das
aflições, angústias, dificuldades, e
tribulações que Deus permitiria (decreto permissivo) que
Satanás trouxesse a este membro em pecado. Ele deveria ser levado ao
arrependimento, cair em si e voltar ao convívio da igreja.
Não sabemos se a “estratégia” funcionou. Na
Segunda carta que Paulo escreve à Igreja de Corinto há uma
menção de alguém que se arrependeu, que mudou sua atitude.
Paulo não diz quem foi esta pessoa. Mas Paulo recomenda que a igreja o
receba, que o aceite, que não prolongue demasiadamente a disciplina para
que ele não desfaleça. Alguns entendem que seja exatamente este
homem citado por Paulo no v. 5.1. Se for o caso, a disciplina teria funcionado e
o pecador voltado arrependido, recuperado, restaurado, e a igreja o teria
recebido com alegria. Paulo passa para uma postura final e só depois
explica o porque desta atitude. Pode parecer aos ouvidos pós-modernos uma
atitude muito radical. Mas Paulo explica o porque de sua atitude.
As Razões de Paulo Para a Disciplina
Rígida
1) Porque o pecado é como o fermento (v. 6). Se não
cuidarmos ele se alastra e contamina toda a massa: “Não sabeis
que um pouco de fermento leveda a massa toda?”. Paulo usa uma
linguagem muito comum no VT. No VT uma das coisas usadas para tipificar o pecado
é o fermento. Tanto é que na celebração da
páscoa era proibido se comer pão com fermento (o pão era
“asmo” – sem fermento). O fermento era símbolo do
pecado. Uma das propriedades do fermento pelas quais ele tornou-se
símbolo do pecado, é sua capacidade de aumentar e dominar o
ambiente onde se encontra. Se colocado um pouco de fermento no pão que
está sendo preparado logo levedará toda a massa. O apóstolo
diz que o pecado é exatamente assim. Paulo pergunta se os crentes de
Corinto não sabem disso: Que o pecado é como o fermento, que
leveda toda a massa? A idéia é que, se deixado sem
correção, no seio da igreja, sem que as devidas
soluções sejam tomadas, o pecado se propaga. O que pensar dos
jovens da igreja de Corinto? O que eles estavam aprendendo quando viam aquele
homem vivendo com a madrasta e ninguém dava importância? O que eles
estavam aprendendo? Aprendiam, que aquela atitude não faz
diferença na vida cristã e que não importa nosso
comportamento sexual. Podemos continuar em pecado e como um cristão
normal. Era essa a mensagem que estava sendo passada para os membros da igreja;
que o pecado realmente não importava porque a igreja parecia aceitar
normalmente. Qual a mensagem que está sendo passada para os jovens e
novos convertidos? Que o pecado não afeta meu estado, o meu
relacionamento e minha comunhão com Deus e nem a vida da igreja. Ou seja,
o que é pregado no púlpito é totalmente desfeito por este
tipo de atitude. Nós podemos pregar santidade, e se temos de viver vidas
santas mas não acrescentarmos à Palavra pregada as medidas
corretas para que todos nós trilhemos este viver santo, a mensagem deixa
de ter seu efeito.
Quando Calvino começou sua obra em Genebra ele tinha a idéia
de que se houvesse apenas pregação fiel da Palavra de Deus e
administração correta dos sacramentos, a igreja seria edificada,
os crentes ouviriam e os problemas se resolveriam. Algum tempo depois, Calvino
reconheceu que era necessário e bíblico acrescentar um terceiro
elemento: a disciplina eclesiástica.
Há necessidade do exercício da disciplina eclesiástica
feita em amor para recuperação do pecador e para que se coloque em
prática o que a Palavra de Deus nos recomenda e exige. O mais importante
é que Paulo não está aqui falando para a liderança.
Ele está falando para toda a igreja. Não caiamos no erro de
interpretar mal o apóstolo Paulo pois o que ele fala é para todos
nós; é responsabilidade de toda a igreja zelar pela vida da
comunidade seguindo os princípios bíblicos. Porque o pecado
é como o fermento. Se deixarmos ele contamina a massa toda. Que mensagem
estamos passando para o mundo? Qual a mensagem que a “Tiazinha”, que
se diz evangélica, passa para o mundo? Sua mensagem é que
não importa seu comportamento sexual, sua profissão corrupta.
Assim, se conclui que cabe tudo na igreja.
Estamos vivendo um momento de crise de referência na igreja
brasileira. Ou seja, precisamos de pessoas que sejam referenciais. A pouco tempo
a revista “Isto É” publicou um suplemento sobre os maiores
religiosos do século e citava Dom Evaristo Arnes, Alziro Zarur, Chico
Xavier, Madre Tereza, Leonardo Boff, Frei Beto, Marcelo Rossi, mas nenhum
evangélico. Pode ser apenas preconceito contra os evangélicos, mas
pensemos qual evangélico poderia estar nesta lista? Soubemos depois que o
candidato dos evangélicos seria o Bispo Macedo. Se há um momento
em que a igreja precisa fazer diferença no Brasil, é hoje. E temos
de começar nos lembrando de que o pecado é como o fermento. Ele
destrói a reputação da igreja, a sua credibilidade, seu
ensino, e por isso temos de tratá-lo com firmeza. Devemos começar
conosco mesmo, sendo implacáveis com nós mesmos e brandos com os
outros, mas firmes no geral. Tudo isso para evitar que o pecado se alastre. Este
é o caminho. Não estou me referindo a fazermos cruzadas de
moralidade; não creio nisso. Mas devemos pregar o ensino simples do
evangelho e como lemos nos salmos “que os que temem ao Senhor odeiem o
pecado”, se afastem do pecado pois este é o ensino de toda a
Bíblia. O primeiro ensino é este: O pecado é como o
fermento e se nós não cuidarmos ele tomará conta de tudo
corrompendo as consciências.
2) O segundo argumento de Paulo está baseado na Páscoa
(também vem do Velho Testamento). Aqui no v. 7 Paulo se refere a Cristo
como sendo nossa Páscoa e que ele já foi imolado por nós.
Paulo compara a vida da igreja a uma grande Páscoa, a uma eterna festa. O
nosso Cordeiro Pascal já foi imolado e nós já nos
alimentamos dele e se vivemos em uma eterna Páscoa, não deve haver
fermento. Tem de ser lançado fora os fermentos, a massa velha. Por isso
Paulo diz: “Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova
massa...” (v.7). A Igreja é a comunidade Pascal liderada, salva
e resgatada por aquele que é a nossa Páscoa. Na festa da
Páscoa não podia se ter pão com fermento. Essa é a
figura que Paulo usa. Se há pão fermentado já não
é mais Páscoa. No v. 8 Paulo diz da vida cristã que
“celebremos a festa, não com o velho fermento, nem com o
fermento da maldade e da malícia; e, sim, com os asmos da sinceridade e
da verdade”. É só quando a sinceridade e a verdade
prevalecem que nós verdadeiramente celebramos. Somos uma comunidade que
celebra, que vive na alegria, no gozo da santidade do nosso Cordeiro.
É claro que Paulo não está pregando o perfeccionismo.
Mas alguns podem ter esta idéia; Paulo não está pedindo que
a igreja seja perfeita, mas sim que a igreja de Corinto tome as atitudes certas
quando o pecado aparecer. O pecado vai aparecer, é verdade, e pode ser em
minha vida e na sua, mas que a comunidade ajude o pecador com interesse de
auxiliá-lo. Não devemos ficar falando mal e criticando mas que
tomemos as providências bíblicas para ajudar aquele que caiu
vítima do pecado. Celebremos a festa com os “asmos” da
sinceridade e da verdade.
3) Vemos um outro princípio nos versos 9-12. Há um momento
para uma separação santa. Infelizmente há momentos em que
somente uma separação resolve. A separação da
comunidade colocada aqui por Paulo é daquele membro impenitente que
não deseja arrepender-se. Parece que Paulo coloca este ponto em destaque
(ele gasta vários versículos nisso) provavelmente porque ele sente
que foi mal compreendido. Paulo já havia escrito uma primeira carta aos
coríntios. Essa primeira carta que conhecemos é, na verdade, uma
segunda carta, porque Paulo já havia escrito uma carta antes que foi
perdida. Paulo faz menção desta primeira carta perdida no v. 9.
Nesta primeiríssima carta ele já havia falado da necessidade de
separação, de não haver associação entre o
cristão e a impureza. “Já em carta vos escrevi que
não vos associásseis com os impuros”.
Aparentemente os coríntios haviam entendido que Paulo estava falando
que os cristãos não deveriam ter qualquer contato com
incrédulos. Por isso os coríntios concluíram que
não haveria problema de ter associação com aquele
irmão, mesmo que em gravíssimo pecado, visto que era
“irmão”. Eles haviam pensado da primeira carta de Paulo que
não deveriam se associar apenas com quem não fosse cristão.
Paulo, então, corrige este equívoco e diz: “Já em
carta vos escrevi que não vos associásseis com os impuros;
refiro-me com isto não propriamente aos impuros deste mundo, ou aos
avarentos, ou roubadores, ou idólatras; pois, neste caso teríeis
de sair do mundo”. Paulo, aqui, está dizendo que não
estava dizendo que não se associassem, ou mantivessem contato com este
tipo de gente, com os pecadores deste mundo, porque, se assim fosse, teriam de
sair do mundo. Paulo nunca sugeriu um gueto ou mosteiro, nem ao menos estava
sugerindo que não convivessem com os não cristãos. O que
Paulo diz é: “Mas agora vos escrevo que não vos associeis
com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou avarento,
ou idólatra ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com este tal
nem ainda comais” (v.10). O que Paulo está dizendo é que
não devemos nos associar com aquele que “dizendo-se
irmão”, se fazendo passar por cristão, no meio da
comunidade se comportem como não cristãos. A estes nem devemos
convidar para uma refeição em nossas casas. Em outras palavras,
há um momento em que é necessária uma
separação clara e firme.
Muitos podem estar pensando nas palavras de Jesus quando disse:
“Não julgueis, para que não sejais julgados”
(Mt 7:1). É claro que Paulo e Jesus não estão em
contradição. Quando Jesus disse estas palavras ele o fez no
contexto do julgamento indevido. Ou seja, alguém julgar o comportamento
de uma pessoa e não julgar-se a si mesmo. Lembremo-nos que nesta mesma
passagem Jesus diz: “Por que vês tu o argueiro no olho de teu
irmão, porém não reparas na trave que está no teu
próprio” (Mt 7.3). O que Jesus proibiu foi o julgamento
desproporcional, sendo pesado para com os outros e não para consigo
mesmo. Isto não é correto! Mas quando Jesus fala estas palavras
condenando o julgamento precipitado, no versículo 6 Ele diz:
“Não deis aos cães o que é santo, nem lanceis ante
os porcos as vossas pérolas...” (Mt 7:6). Para eu cumprir este
mandamento eu tenho de saber quem é “cão” e quem
é “porco”. Ou seja, tenho de exercer julgamento.
É claro que Jesus não está proibindo que nós, pelas
evidências, pelo comportamento, por aquilo que está evidente e
claro, cheguemos a uma conclusão de que uma pessoa não está
se comportando como um cristão deve se comportar. Assim sendo podemos
tomar as devidas providências.
Paulo termina este terceiro princípio dizendo: “Pois com
que direito haveria eu de julgar os de fora?” (5:12a). Paulo
está dizendo que não vai julgar os de fora que não
são cristãos e que vivem em outro contexto. E então
pergunta: “Não julgais vós os de dentro?”
(v.12b). Paulo aqui deixa muito claro que julgar os “de
dentro” é competência da igreja. Não vamos julgar
os de fora, pois Deus os julgará. É isso que Paulo diz no
versículo 13: “Os de fora, porém, Deus os
julgará” (v.13a). Mas os de dentro sim; a comunidade julga os
de dentro e toma as providências para recuperar o faltoso, o extraviado,
para trazer de volta o que se desviou. E, se necessário for, para isso, a
santa separação, que haja separação.
Paulo conclui no v.13 dizendo: “Expulsai, pois, de entre
vós o malfeitor”.
Conclusão
Estamos vivendo uma época em que se Paulo viesse expor esta
mensagem, desta forma, não seria bem recebido.
Hoje se diz que a verdade é relativa e que cada pessoa tem sua
própria verdade. Estamos vivendo a relativização dos
valores morais. Se diz que a vida de cada um é governada por aquilo que a
pessoa sente que é melhor. Se a pessoa está se sentindo bem em
determinado lugar, se algo está fazendo-lhe bem, então, não
importa outras questões, outros critérios. O critério que
é usado é sentir-se bem e passa a ser o principal para governar a
conduta das pessoas. O que valida uma situação ou uma conduta
é eu estar ou não me sentindo bem no que estou fazendo.
Esses conceitos têm predominado em nossa sociedade e em muitas
igrejas. A relativização na mídia, nas músicas, nos
escritos modernos, nas universidades, nos debates da ética e da
moralidade. Os formadores de opinião pública nacional estão
totalmente envolvidos na pós modernidade que resume tudo que foi dito.
Tudo isso acaba minando a vida da igreja, a literatura, os seminários, os
congressos. Às vezes, de forma sutil, nos tornamos avessos aquilo que
venha nos contrariar, que venha nos obrigar a dizer: “Isso está
errado!”.
Mas temos de fazer a escolha. É um momento sério de
decisão da Igreja, se vamos viver à luz da Palavra de Deus e de
seus valores absolutos ou se vamos nos deixar levar pelos “ventos”
da época.
A Palavra de Deus nos chama a viver vidas santas e retas. Nos chama a
aborrecer o pecado e se necessário, tomar as devidas providências
para que ele não tenha livre curso em nosso meio, nas nossas vidas, nas
nossas famílias. Tomar a providência necessária em amor, em
espírito de brandura, olhando por nós mesmos para que não
sejamos também levados pelo pecado mas ajudando-nos mutuamente, levando
as cargas uns dos outros para que a comunidade toda viva vida de santidade e de
alegria. O problema não é o pecado somente, mas o pecado
não resolvido. Para o pecado há perdão, resgate,
redenção e libertação. O problema não
é só o pecado mas o pecado não confessado, não
reconhecido e não tratado. É contra isso que Paulo fala. Que Deus
nos ajude.
Lembremo-nos que esta mensagem é para a igreja e não para os
líderes. Sempre fico admirado com Paulo pelo fato de que quando fala de
disciplina eclesiástica ele não se dirige aos pastores e aos
presbíteros apenas mas fala para à comunidade toda. É nossa
responsabilidade de orarmos e vivermos vidas santas ajudando-nos uns aos outros
a nos livrar do inimigo das nossas almas. Esse é o pior inimigo: o pecado
não tratado.
Que Deus nos dê graça e misericórdia para vivermos
segundo o padrão da Palavra de Deus.