O Caráter do Político
Astuto
Um Estudo Sobre a Vida de
Absalão
Solano Portela
2 Samuel, capítulos 13 a 18
Introdução
A história de
Absalão não é uma história bonita. Filho do Rei
Davi, ele teve uma existência marcada por inúmeros pecados. Era uma
pessoa atraente, simpática, e famosa, que realmente chamava a
atenção. Poucas pessoas no mundo poderiam receber o tipo de
descrição que dele é feita em 2 Sm 14.25:
“Não havia, porém, em todo o Israel homem tão
celebrado por sua beleza como Absalão; da planta do pé ao alto da
cabeça, não havia nele defeito algum”. Quando lemos a
sua história, registrada nos capítulos 13 a 18 de 2 Samuel, vemos
que ele era um daqueles “líderes natos”, com personalidade
marcante e carismática. Era impulsivo em algumas ações, mas
igualmente maquinador e conspirador para preencher suas ambições
de poder. Por trás de um passado que abrigava até um assassinato
de seu irmão, ele não hesitou em utilizar e manipular pessoas e
voltar-se contra seu próprio pai, para vir a governar Israel. Uma vez no
poder, demonstrou mais impiedade, crueldade e imoralidade. No seu devido tempo,
foi castigado por Deus, sofrendo uma morte inglória, sendo Davi
reconduzido ao poder.
O caráter de Absalão não
é diferente de muitos personagens contemporâneos de nossa
política. Na realidade, ele reflete bem como a ambição pelo
poder, conjugada com outros pecados, transtorna o comportamento de
políticos “espertos” e “astutos”, levando-os a
uma vida de engano e egoísmo desenfreado, na maioria das vezes com o
aproveitamento pessoal do bem público. Necessitamos de sabedoria e
discernimento, para penetrarmos a couraça de fingimento que é
mostrada à sociedade. Necessitamos de uma conscientização
de nossas responsabilidades, como cidadãos, para que estejamos cobrando,
com o devido respeito, as responsabilidades de nossos governantes, conforme
estipuladas nas Escrituras em Romanos 13.
Nosso propósito, neste
artigo, é estudar as ações de Absalão registradas no
capítulo 15 de 2 Samuel, versos 1 a 12, identificando algumas
peculiaridades de sua pessoa e caráter para que sirva de alerta à
nossa percepção do mundo político e da busca pelo poder.
Queremos verificar se essas características são reflexos da
natureza humana submersa em pecado, e aprender que devemos resguardar nosso
apoio irrestrito, a tais pessoas de intensa ambição. Devemos
também agir responsavelmente como cidadãos cristãos, na
medida do possível, para que as instituições que tais
pessoas pretendem governar sejam também resguardadas.
As Características de Absalão
Vejamos, 10 características do político astuto e matreiro que
foi Absalão, conforme o relato que temos no capítulo 15 do Segundo
livro de Samuel:
1. Ostentação e
demonstração de poder. No verso 1, lemos: “Depois
disto, Absalão fez aparelhar para si um carro e cavalos e cinqüenta
homens que corressem adiante dele”. No capítulos 13 e 14 lemos
como Absalão ficou foragido, após assassinar seu irmão.
Aparentemente, Davi tinha grande amor por Absalão e, após
três anos dos acontecimentos que culminaram no assassinato e fuga, Davi o
recebe de volta. Absalão era famoso. Em 2 Sm 14.25 lemos que ele era
“celebrado” por suas qualidades físicas invejáveis e
impecáveis. Possivelmente tudo isso havia “subido à
cabeça”. Em vez de assumir uma postura de humildade e
contrição, em seu retorno, o texto nos diz que ele trafegava em
uma carruagem com cavalos. Semelhantemente a tantos políticos
contemporâneos ele se deleitava na ostentação e na
demonstração de poder. Nesse sentido, formou um
extraordinário séquito de “batedores” –
cinqüenta homens que corriam “adiante dele”. Certamente tudo
isso contribuía para chamar ainda mais atenção, para a sua
pessoa, e ia se encaixando nos planos que possuía, para a tomada do
poder. Vamos ter cuidado com aqueles que buscam a ostentação e a
demonstração do poder que já possuem, pois irão
aspirar sempre mais e mais, às custas de nossa liberdade.
2.
Comunicação convincente. O verso 2, diz:
“Levantando-se Absalão pela manhã, parava à
entrada da porta; e a todo homem que tinha alguma demanda para vir ao rei a
juízo, o chamava Absalão a si e lhe dizia: De que cidade és
tu? Ele respondia: De tal tribo de Israel é teu servo...”.
Parece que Absalão não era preguiçoso. Levantava-se cedo e
já estava na entrada da cidade, falando com as pessoas. Possivelmente
tinha facilidade de comunicação, de “puxar conversa”.
Identificava aqueles que tinham necessidades, aqueles que procuravam acertar
alguma disputa e logo entrava em conversação com eles. Certamente
essa é uma das características que nunca falta aos que aspiram o
poder. Devemos olhar além da forma – devemos atentar para o
conteúdo e a substância, procurando discernir os motivos do
comunicador.
3. Mentira. O verso 3 mostra que Absalão era
mentiroso. Era isso que Absalão comunicava àqueles com os quais
ele conversava, com os que tinham demandas judiciais a serem resolvidas:
“Então, Absalão lhe dizia: Olha, a tua causa é boa
e reta, porém não tens quem te ouça da parte do
rei”. Descaradamente ele minava a atuação, autoridade e
função do rei Davi, seu pai. Com a “cara mais limpa”,
como muitos políticos com os quais convivemos, passava uma falsidade como
se fosse verdade. Certamente existia quem ouvisse as pessoas, em suas demandas.
Certamente, nem toda causa era “boa e reta”, mas Absalão
não estava preocupado com isso, nem com a verdade. Ele tinha os seus
olhos postos em situação mais remota. Ele queria o poder a
qualquer preço. Para isso não importava se ele tinha que atropelar
até mesmo o seu pai. Não sejamos crédulos às
afirmações inconseqüentes, às
generalizações mentirosas de tantos que aspiram o poder.
4.
Ambição e engano. O verso 4, confirma a linha de
ação adotada por Absalão, na trilha da
decepção: “Dizia mais Absalão: Ah! Quem me dera
ser juiz na terra, para que viesse a mim todo homem que tivesse demanda ou
questão, para que lhe fizesse justiça!” Será que
realmente acreditamos que o malévolo Absalão estava mesmo
preocupado com o julgamento reto das questões? Será que ele tinha
verdadeira “sede e fome de justiça”? A
afirmação demonstra, em primeiro lugar que a sua
ambição era bem real – ele queria ser “juiz na
terra” – posição maior que era ocupada pelo rei seu
pai. Quanto à questão de “fazer justiça”
– será que realmente podemos acreditar? Certamente com a
demonstração de impiedade e injustiça que retratou
posteriormente, quando ocupou o poder, mostra que isso era ledo engano aos
incautos. Quantas pessoas terão sido iludidas por ele! Quantas o apoiaram
porque acharam que ali estava a resposta a todas as suas preces e anseios
– “finalmente, alguém para fazer justiça”! Como
é fácil sermos iludidos e enganados em nossas necessidades!
Não sejamos ingênuos para com promessas que não
poderão ser cumpridas.
5. Bajulação. No verso
5, vemos como Absalão era mestre em adular aos que lhe interessavam:
“Também, quando alguém se chegava para inclinar-se diante
dele, ele estendia a mão, pegava-o e o beijava”. Que
político charmoso! Estava prestes a receber um cumprimento, mas ele se
antecipava! Com uma modéstia que era realmente falsa, como
veríamos depois, ele fazia as honras para com o que chegava. Realmente
era uma pessoa que sabia fazer com que os que o visitavam se sentissem
importantes. Sempre gostamos de receber um elogio, de sermos bem tratados.
Tenhamos a percepção de verificar quando existem interesses
ocultos ou motivos noturnos por trás da cortesia aparente.
6.
Furto de corações – O despertar de seguidores
ferrenhos! O verso 6 fala literalmente dessa característica.
Não, Absalão não violava sepulturas, nem estava interessado
em transplantes de órgãos. Mas no sentido bem coloquial ele
“roubava corações”: “Desta maneira fazia
Absalão a todo o Israel que vinha ao rei para juízo e, assim, ele
furtava o coração dos homens de Israel”. Com as
ações descritas nos versos precedentes, Absalão angariava
seguidores apaixonados por seu jeito de ser. Sua bandeira de justiça
livre e abundante para todos, capturava o interesse, atenção e
lealdade dos cidadãos de Israel. Não importava se havia um rei,
legitimamente ungido pelo profeta de Deus. Aqui estava um pretendente ao poder
que prometia coisas muito necessárias. Que era formoso de parecer. Que
falava bem. O que mais poderiam as pessoas esperar de um governante? Será
que alguém se preocupou em averiguar a sinceridade das palavras e das
proposições? Será que alguém tentou aferir se as
promessas proferidas eram possíveis de ser cumpridas? O alerta é
para cada um de nós, também.
7. Falsa religiosidade
– Os versos 7 a 9 registram: “Ao cabo de quatro anos, disse
Absalão ao rei: Deixa-me ir a Hebrom cumprir o voto que fiz ao SENHOR,
Porque, morando em Gesur, na Síria, fez o teu servo um voto, dizendo: Se
o SENHOR me fizer tornar a Jerusalém, prestarei culto ao
SENHOR”. É incrível como muitos políticos, mesmo
desrespeitando os mais elementares princípios éticos, pretendem,
em ocasiões oportunas, demonstrar religiosidade e devoção.
No transcorrer do texto, vemos que tudo não passava de casuísmo,
da parte de Absalão. Ele procurava costurar alianças. Procurava
trafegar pela terra realizando os seus contatos, mas a fachada era a sua
devoção religiosa. Pelo amor ao poder, antigos ateus declarados,
se apresentaram como religiosos devotos. No campo evangélico deve haver
uma grande conscientização de que existe uma significativa
força eleitoral e política. Na busca pelo voto evangélico,
muitos se declaram adoradores do Deus único e verdadeiro. Não nos
prendamos às palavras, mas examinemos a vida e as obras de cada um,
à luz das idéias que defendem. Vejamos também se as
propostas apresentadas se abrigam ou contradizem os princípios da Palavra
de Deus.
8. Conspiração – O verso 10, mostra
que, finalmente, Absalão partiu para a conspiração aberta:
“Enviou Absalão emissários secretos por todas as tribos
de Israel, dizendo: Quando ouvirdes o som das trombetas, direis: Absalão
é rei em Hebrom”. Insurgiu-se de vez contra o rei que havia
sido ungido por Deus, para governar Israel. Não – ele não
era um democrata que queria instalar uma república naquela terra.
Valia-se de sua personalidade magnética, do seu poder de
comunicação e das ações comentadas e registradas nos
versos anteriores, para instalar um governo que seria não somente
despótico, como opressor e abertamente imoral (2 Sm 16.22). Que Deus nos
guarde dos políticos conspiradores, que desrespeitam as leis e
autoridades e que são egoístas em sua essência.
9.
Utilização de inocentes úteis – Leiamos o
verso 11: “De Jerusalém foram com Absalão duzentos homens
convidados, porém iam na sua simplicidade, porque nada sabiam daquele
negócio”. Certamente essas duzentas pessoas, selecionadas a dedo,
eram pessoas importantes e influentes. Certamente transmitiram a
impressão que havia um apoio intenso e uniforme às
pretensões de Absalão. Vemos que não é de hoje que
as pessoas participam de uma causa sem a mínima noção de
todas as implicações que se abrigam sob o apoio prestado. Devemos
procurar pesquisar e estarmos informados sobre as causas públicas e sobre
as questões que afetam a nossa vida e a da nossa nação.
Nunca devemos permitir que sejamos utilizados como “inocente
úteis” em qualquer causa, como foram aqueles
“convidados” de Absalão.
10. Populismo –
O verso 12 registra: “Também Absalão mandou vir Aitofel,
o gilonita, do conselho de Davi, da sua cidade de Gilo; enquanto ele oferecia os
seus sacrifícios, tornou-se poderosa a conspirata, e crescia em
número o povo que tomava o partido de Absalão”. Vemos
que, saindo do estágio secreto, a campanha ganhou as ruas e ganhou
intensa popularidade, ao ponto em que um mensageiro chegou a dizer a David (v.
13) “o coração de todo Israel segue a
Absalão”. Um dos ditos populares mais falsos é: “a
voz do povo é a voz de Deus”. Não nos enganemos –
muitas questões são intensamente populares, mas totalmente
contrárias aos princípios da Palavra. Assim é também
com as pessoas – a popularidade não é um selo de
aprovação quanto ao comportamento ético e justo.
Democracia (a regência pela maioria do povo) não é
uma forma de se estabelecer o que é certo e o que é errado, mas
uma maneira administrativa de se reger o governo sob princípios absolutos
que não devem ser manipulados pela maioria, ou por minorias que se
insurgem contra esses preceitos de justiça. Como cristãos, devemos
ter uma visão muito clara dos princípios eternos de
justiça, ética e propriedade revelados por Deus em Sua
Palavra.
Conclusão
A história de Absalão que se iniciou no capítulo 13,
continua até o capítulo 18. Absalão sempre gravitou
próximo ao poder, mas aspirava o poder absoluto. Para isso, fez campanha,
conspirou e lutou contra o seu próprio pai. Aparentemente esse
político astuto foi bem sucedido. Foi alçado ao poder e lá
se consolidou perseguindo e aniquilando os seus inimigos, entre os quais
classificou o seu pai Davi, a quem tentou, igualmente, matar. Ocorre que os
planos de Deus eram outros. Seu conturbado reinado foi de curta
duração. Causou muita tristeza, operou muita injustiça e
terminou seus dias enganchado pelos cabelos em uma árvore, enquanto
fugia, e foi morto a flechadas.
Parece que vivemos permanentemente em
campanha eleitoral, em nossa terra. A política, naturalmente, desperta
fortes paixões, interesses e defesas. Muitos políticos, em sua
busca pelo poder, passam a demonstrar muitas características demonstradas
na vida de Absalão. É natural que alguém que almeja um
cargo de liderança qualquer, possua um comprometimento intenso às
suas idéias e objetivos. Os partidários, também submergem
nesse mesmo espírito de luta. O problema vem quando a paixão, quer
pelo líder, quer pelo poder, leva à cegueira moral, como na vida
de Absalão. Nesse caso, desaparece a ética e princípios
são atropelados. Os partidários, às vezes até sem
perceberem, são sugados e manipulados. Em muitas ocasiões
verificam que se encontram em uma posição de defender até o
que não acreditam.
O cristão tem que se esforçar
para ter uma consciência e vida tranqüila e serena perante Deus e
perante os homens. Ele tem que se conscientizar que a sua lealdade é
primordialmente para com Deus, para com a Sua Palavra objetiva, para com a causa
do evangelho. Participação política consciente não
significa lealdade inconseqüente. Na maioria das vezes o cristão
verificará que se apoia esse ou aquele candidato, assim o faz não
porque ele é o ideal e defensável em qualquer
situação, mas porque representa o menor dos males, entre as
escolhas que lhes são apresentadas. Sobretudo ele não pode se
deixar manipular, como no caso dos seguidores de Absalão. Devemos,
sempre, com respeito, apontar o desrespeito aos princípios encontrados
nas Escrituras, por aqueles sobre os quais Deus colocou a responsabilidade de
liderar o governo e as instituições de nosso país,
lembrando 1 Tm 2.1-8, intercedendo sempre por eles em
oração.